Eu até acho que um filme não tem de ser igual a um livro...
Acho, isso sim, que o filme (quando baseado num livro) deveria transmitir a ideia do autor. Nem sempre se conta a história da mesma maneira... os "narradores" são diferentes.... mas a mensagem essa deveria ser a mesma.
Aconteceu isso com o "Blindness", relativamente ao "Ensaio sobre a Cegueira". O filme não era o livro, mas quem vê o filme entende a mensagem que Saramago pretendia veicular através do livro.
No "Enemy" isso não acontece. Por conta da última cena do filme que me demorou a entender, andei a ler alguns comentários ao filme em sítios da internet... basicamente, o que as pessoas pensam é que se trata de uma personagem a combater o medo de assumir um compromisso com uma mulher. Por isso, vive vidas imaginadas em que se vê descomprometido. A aranha é o símbolo do compromisso a que ele não pode escapar.
Entenda-se que, vendo o filme sem ter lido o livro, esta explicação é bastante plausível.
No entanto, não me parece que esta fosse a mensagem do "Homem Duplicado". E quem vê o filme está longe de sentir o que Saramago queria que sentíssemos quando criou esta espécie de alegoria.
Acho eu. Vale o que vale.
Não desgostei do filme. Mas, tendo em conta o livro, esperava muito muito muito mais.
Eu acho que a aranha é kafkiana. Significa a mudança. Num mundo em que somos duplicados uns dos outros. Num mundo em que as pessoas aprendem as mesmas coisas, vivem as mesmas coisas, ouvem as mesmas coisas e pior... pensam as mesmas coisas. Não temos de ser fisicamente iguais para sermos iguais. Acabei o livro a pensar "quem sou eu?". Serei eu o duplicado de centenas de milhares de pessoas que vivem o mesmo tempo que eu?
A aranha, que não existe no livro, e aparece ao abrir de uma porta, poderia significar mesmo a mudança. E estamos prontos a aceitar a mudança, deixamo-la entrar? Ou fechamos a porta e viramos as costas? Continuamos uma vida inteira sendo autómatos? Robots? Duplicados?