Este é o meu feriado preferido. Não sei explicar o porquê, mas simplesmente é. Muitas pessoas vão falar dos capitães de Abril. Na televisão vão passar filmes. Vai-se ouvir a Grândola Vila Morena e o E depois do Adeus. Vai-se falar na madrugada de 24 e dos sinais. Vai-se falar na Guerra Colonial e no Salazar e no Marcelo Caetano.
Mas o 25 de Abril começou a fazer-se muito antes daquela madrugada. O 25 de Abril começou muito antes do descontentamento de uma dúzia de capitães. O meu elogio vai para os poetas. Os poetas que nos mostraram que as palavras ferem. Os poetas que nos mostraram que sem armas também se luta. Os poetas que nos mostraram que nem só de amor fala um poema. Aliás, poetas que nos mostraram que não é de amor que falam os poemas. Poetas que fugiram à censura com metáforas. Metáforas que são armas que ferem. Apontaram armas ao regime e foram abrindo os olhos das pessoas. Lutaram com as armas que tinham: as palavras.
Dei aulas de Português no ano dos 30 anos do 25 de Abril. No programa, "poetas do século XX". E foi tão bom ir de Jorge de Sena, a Alexandre O'Neill, passando por Manuel Alegre e Vasco Lourenço. Uns trechos do Felizmente há luar! do Stau Monteiro. António Gedeão. José Carlos Ary dos Santos. Ouvir dos meus alunos "Ó stôra, como é que eles não perceberam que a Tourada era a falar mal deles? Até nós percebemos!". Porque eles não sabem nem sonham, meus queridos. Eles não sabem nem sonham.
Adriano Correia de Oliveira e Sérgio Godinho e Zeca Afonso e o Carlos Paredes e o Fernando Tordo e tantos tantos tantos. Tantos esquecidos. Tantos que não são lembrados suficientemente pelo grande serviço que fizeram a este País. Os mais belos poemas de amor que alguma vez li foram escritos em tempo de ditadura. Aquela, a dita dita dura. Não um amor carnal, sexual, de homem mulher, mulher mulher, homem homem whatever. Um amor muito mais profundo, mais visceral. O verdadeiro amor. O amor à Humanidade. O amor à Justiça. O amor à Liberdade.
Hoje, a minha sentida homenagem aos homens e mulheres que escreveram poemas com voz de liberdade. Aos homens e mulheres que lutaram com metáforas. Aos homens e mulheres que nos ensinaram que mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão, há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não. Poetas que sentiram, no dia da Liberdade, a mágoa de não o partilharem com os que com eles lutaram... "Tantos morreram sem ver, o dia do despertar! Tantos sem poder saber, com que letras escrever, com que palavras gritar!".
Às palavras. Aos poetas. À luta. À liberdade. Vivamos a Liberdade que conquistaram para nós. Em ano de eleições, deixem a praia para outro dia, deixem os passeios para outras alturas e vamos votar. Agora podemos. Votar, escolher e mudar o Mundo.
Mas o 25 de Abril começou a fazer-se muito antes daquela madrugada. O 25 de Abril começou muito antes do descontentamento de uma dúzia de capitães. O meu elogio vai para os poetas. Os poetas que nos mostraram que as palavras ferem. Os poetas que nos mostraram que sem armas também se luta. Os poetas que nos mostraram que nem só de amor fala um poema. Aliás, poetas que nos mostraram que não é de amor que falam os poemas. Poetas que fugiram à censura com metáforas. Metáforas que são armas que ferem. Apontaram armas ao regime e foram abrindo os olhos das pessoas. Lutaram com as armas que tinham: as palavras.
Dei aulas de Português no ano dos 30 anos do 25 de Abril. No programa, "poetas do século XX". E foi tão bom ir de Jorge de Sena, a Alexandre O'Neill, passando por Manuel Alegre e Vasco Lourenço. Uns trechos do Felizmente há luar! do Stau Monteiro. António Gedeão. José Carlos Ary dos Santos. Ouvir dos meus alunos "Ó stôra, como é que eles não perceberam que a Tourada era a falar mal deles? Até nós percebemos!". Porque eles não sabem nem sonham, meus queridos. Eles não sabem nem sonham.
Adriano Correia de Oliveira e Sérgio Godinho e Zeca Afonso e o Carlos Paredes e o Fernando Tordo e tantos tantos tantos. Tantos esquecidos. Tantos que não são lembrados suficientemente pelo grande serviço que fizeram a este País. Os mais belos poemas de amor que alguma vez li foram escritos em tempo de ditadura. Aquela, a dita dita dura. Não um amor carnal, sexual, de homem mulher, mulher mulher, homem homem whatever. Um amor muito mais profundo, mais visceral. O verdadeiro amor. O amor à Humanidade. O amor à Justiça. O amor à Liberdade.
Hoje, a minha sentida homenagem aos homens e mulheres que escreveram poemas com voz de liberdade. Aos homens e mulheres que lutaram com metáforas. Aos homens e mulheres que nos ensinaram que mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão, há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não. Poetas que sentiram, no dia da Liberdade, a mágoa de não o partilharem com os que com eles lutaram... "Tantos morreram sem ver, o dia do despertar! Tantos sem poder saber, com que letras escrever, com que palavras gritar!".
Às palavras. Aos poetas. À luta. À liberdade. Vivamos a Liberdade que conquistaram para nós. Em ano de eleições, deixem a praia para outro dia, deixem os passeios para outras alturas e vamos votar. Agora podemos. Votar, escolher e mudar o Mundo.
Ser ou não ser
Qualquer coisa está podre no Reino da Dinamarca.
Se os novos partem e ficam só os velhos
e se do sangue as mãos trazem a marca
se os fantasmas regressam e há homens de joelhos
qualquer coisa está podre no Reino da Dinamarca.
Apodreceu o sol dentro de nós
apodreceu o vento em nossos braços.
Porque há sombras na sombra dos teus passos
há silêncios de morte em cada voz.
Ofélia-Pátria jaz branca de amor.
Entre salgueiros passa flutuando.
E anda Hamlet em nós por ela perguntando
entre ser e não ser firmeza indecisão.
Até quando? Até quando?
Já de esperar se desespera. E o tempo foge
e mais do que a esperança leva o puro ardor.
Porque um só tempo é o nosso. E o tempo é hoje.
Ah se não ser é submissão ser é revolta.
Se a Dinamarca é para nós uma prisão
e Elsenor se tornou a capital da dor
ser é roubar à dor as próprias armas
e com elas vencer estes fantasmas
que andam à solta em Elsenor
(Manuel Alegre)
12 comentários:
Que bom teres lembrado também os guerreiros das palavras! :)
O 25 de Abril de 1974 passou (como acontecimento) e gosto de pensar que as armas físicas já não são precisas porque as outras armas, as palavras, continuam lá, para garantirem o que foi ganho e sempre prontas a serem usadas para novas batalhas!
Eu também tive a sorte de ter uma professora que me ensinou que a revolução não foi apenas aquele momento concreto, que já havia um princípio de revolução mais discreto antes de tudo aquilo. Mas sei por experiência própria que é muito fácil esquecer isso e focarmo-nos apenas no mais palpável... Felizmente há pessoas como tu que não nos deixam esquecer! Muito obrigado! :)***
Que belo texto, amiga.
DEpois disto, não me apetece escrever sobre o 25 de Abril. Porque tu disseste tudo.:)
Mr. Rice: Estes foram os verdadeiros guerreiros. Eles construiram a liberdade, com palavras e não com armas nem violência. E sim, estes poemas podiam ser lidos hoje com grande actualidade. A diferença é uma: hoje nós podemos escolher. Não vale de nada passarmos a vida a lamentar-nos e depois não votar. Temos de tomar o nosso futuro nas nossas mãos. Por causa destes guerreiros, nós podemos :)
Obrigada!
Kisses
Lita: Nunca está tudo dito :) este dia diz-me muito e o que aqui escrevi saiu-me do coração.
Beijos!
Este feriado comporta muita coisa diferente...nós nunca nos lembramos de tudo...:)
E estas palavras são lindas...:)
bjitos
A geração de 74, na qual eu me incluo, não pode deixar de esquecer o grande significado desta data. Parece-me que a juventude actual está pouco importada com este acontecimento...
Talvez seja uma questão educacional.
Lilipat: estas palavras vão ficar gravadas na História e ainda bem :)
Dylan: Pois... que pais são estes, não é? Enquanto professora tentei fazer a minha parte... mas é impressionante que encontrei miúdos que sabiam tudo do 25 de Abril e outros que não sabiam nada. Encontrei inclusivamente, no ano em que estive nos prolongamentos de horário do 1º ciclo, um miúdo de 8 anos que sabia de cor todas as músicas do Zeca Afonso. Quando há miúdos que ouvem em casa que estamos mal e que no tempo do Salazar é que era... Podemos estar mal, mas nunca estivémos tão bem e parece-me que esta mensagem não passa...
E eu nasci em 1980 e vivo o 25 de Abril como se lá estivesse estado. :)
É preciso não esquecer nunca.
"Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo"
Sophia de Mello B. Andresen
O documentário que passou sobre ela neste 25 de Abril, no canal 2, foi fantástico.
Verónica: embora não tenha sido uma das mais acérrimas lutadoras, ainda assim, merece sem dúvida a homenagem.
O documentário estava mesmo muito bom. :)
Olá,
tens um prémio no meu blog!
Boa semana
:)
Muito bom, este seu post.
Já cheguei atrasado, mas vale, na mesma!
Bjs
Vieira Calado: não vem atrasado :) Obrigada por ter gostado... saiu do coração :)
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